Memórias.

Essa casa não tem memórias suas. 

Não tem a mesa onde tomávamos café e ouvíamos podcast. Não tem o banheiro apertado, onde transávamos em cima da privada fechada. Não tem o escritório, onde você violou minha privacidade pela primeira vez. Não tem nosso quarto, onde você me invadiu e me ameaçou de morte. 

Essa casa não tem memórias suas. E é por isso que eu consigo dormir. 

Tem memórias minhas. Como o dia em que eu acompanhei a retirada do corpo de uma pessoa que se suicidou. Ou todas as vezes que me envergonho de receber visitas - porque todas elas serão supervisionadas pelo porteiro. Ou como gozei na primeira vez com alguém que não era você, na minha cama. Na minha casa. 

Essa casa não tem memórias suas. Mas eu tenho. As piores memórias possíveis. E ainda nelas, preciso encontrar aquela onde você vociferava visceralmente seus pensamentos mais inconscientes sobre mim. E vendo nos seus olhos seu ódio por mim, consigo te odiar. Tão sádica e profundamente, que esqueço do quanto te amei. 

Eu odeio cada aspecto seu. Odeio a forma como eu permiti que você me penetrasse em todos meus espaços, buracos, em todos meus pensamentos. Odeio como você se regozijou no meu sofrimento - sabendo que eu estava tão decadente quanto aquela casa. 

Eu odeio não poder esquecer de você, porque mesmo nas ausências, eu me lembro. 

Comentários

Postagens mais visitadas