acho que nunca antes eu escrevi para um amor que eu sabia que me leria atentamente no momento do recebimento. sempre me confortei com interlocutores ocultos ou que jamais me responderiam de volta; ou que jamais me responderiam à altura; ou que não saberiam o que fazer com isso.
na capa do todas as cartas, da clarice, na sua dedicatória, você diz sobre nossos reencontros, enquanto você se encontra, como se eu também não estivesse perdida. estou lendo outro livro que fala que escutar é um ato de amor. mas que escutar envolve ouvir, compreender e ler nas entrelinhas e eu me acho tão sabichona e às vezes deito e durmo nas entrelinhas, ou coloco meu grande Eu interposto entre as coisas tuas, como Outra na minha vida, trazendo coisas desse Outro lugar. é curioso que outro afeto viu o livro aqui em casa e disse que ia me dar de presente. mas ele não deu. não me escreveu de volta. não respondeu à altura. você sim.
vou começar a discordar toda vez que você me disser que eu sou rígida. não me acho rígida. me acho o pior tipo de pessoa que se pode achar: aquela que acha que entendeu tudo e, na verdade, não entendeu nada.
e que me adiantou ler que o amor precisa de vazio para se movimentar; que ele precisa de atrito para se adiantar, se quando você fala dos seus vazios eu critico eles por não estarem cheios? se quando você me demanda presença, eu entendo como demanda, e não como o amor em seus artifícios que: "quer estar longe quando perto e mais perto quando perto" (C. Drummond de Andrade)?
e me autoflagelar aqui não me isenta de minhas razões, mas todas as minhas razões me desaproximam do amor de fato. quando eu te digo que preciso de tempo, sinto-me como numa digestão de cobra, que demora. como se eu gestasse meus próprios ovos e estivesse vulnerável demais nesse processo de movimentar e criar, precisando de me proteger de mim mesma.
o fato é que de todos os amores eu via o fundo e o pé, o momento em que eu não toparia atravessar descalça e o Outro não me ofereceria calçado, carona, tampouco companhia. amar até aqui foi solitário, talvez por isso eu não saiba amar dividido.
mas algo me pegou na dedicatória que você fez pro meu livro da Clarice: o respeito pelos meus vôos, até por aqueles que parecem fuga, mas que é sabido de que eu retorno, ainda que eu retorne Outra, sempre serei Eu. e eu sempre serei algo em você, mesmo que eu evite dizer que ser Sua, agora nessa era não-monogâmica que estou.
é tão bonito ser amada por você que talvez eu me questione ser capaz de amar igual e aí eu concluo que jamais amarei igual. amarei amanda, amando do meu jeito. e é um jeito que, se tudo der certo, sempre vai te faltar. se der mais certo ainda, aprendo a te escutar e entender como que meu jeito vai encontrar o seu para que satisfaça o suficiente pra que você nunca sinta fome ou frio, mas não se sinta de todo satisfeita... senão, que graça tem?
seria injusto te pedir por tempo porque o tempo é o que menos temos e o que mais nos sobra: não se pode dar aquilo que não se tem. ainda, sempre soube que a vida é um eterno trocar as rodas do carro com ele em movimento então me disponho a trocar a escuta pífia por uma postura mais aberta. não que eu seja fechada, só preciso de tempo. e tempo não se tem para dar.
não quero mais brigar mas sei que para amar, é preciso atrito. amor sem atrito é condenscendência e eu preciso ter minha natureza questionada, até para que eu desmistifique o que eu acredito ser verdade sobre mim mesma e não é. às vezes, queria me ver com seus olhos.
no fim, quero falar do meu amor por você. mas giro e giro e não consigo. porque nunca vivi algo tão natural e bonito. tão simples e, ao mesmo tempo, tão elaborado. que não cabe nas 900 páginas do livro de Clarice, mas cabe na sua dedicatória de 11 linhas.
te amo, Camila!
Meu deus que coisa mais preciosa <3
ResponderExcluirGostei muito da ideia maiúscula das possíveis categorias "Eu" "Outra" "Outro lugar" e "Sua?"
A imagem da dedicatória de 11 linhas equivalendo a 1000 clarices é muito boa, talvez como ilustração, talvez como resgate.