As I said in my previous speech *

Bom, meu amigo, o que tenho a escrever nessa carta são as últimas mudanças pelas quais passei (e venho passando). Gostaria de começar de uma forma amistosa mas o grau de desabafo desmorona qualquer construção poética. Tenho andado muito triste, tão triste que talvez nem eu tenha noção disso. Meus amigos estão distantes demais para que eu os possa alcançar e, sinceramente, nem sei se quero. Meus cabelos estão sem cor, sem forma - sem contar nos quilos a mais. Não que faça muita diferença. Andei tirando todas as minhas fotos da parede e coloquei um mapa da minha vida. E postais. Minha família se desconstituiu e eu ultimamente tenho tido poucos motivos para voltar pra casa. Tudo parece tão quente e abafado que a sensação que eu tenho é de ter sido trancado numa estufa feita de mim mesmo. Caminho pelos corredores da escola sem saber realmente o que fazer, desgosto desde o uniforme até cada grão de poeira que lá se encontram, mas num grau tão leve que chega a ser dispersado e no fundo eu não sinto absolutamente nada. Estou num estado de inércia afetiva tão grande que permiti me apaixonar leve e efemeramente por alguém que eu conheci em menos de 28 horas. Vai passar. Mas tem me mantido um tanto quanto mais humano. Na busca por uma diretriz, me perdi de todos os meus objetivos e vejo meu irmão sucumbir à lapsos psicóticos e ver me apropriar de tudo que é dele, de uma forma ou de outra. Vejo minhas fotos de ontem, quando eu não tinha casa, e sorrio. E meu pensamento ansioso se considera num futuro que se alimenta de si mesmo, onde meu presente parece tão vazio, tão triste, que chora de saudade. Hoje eu choro, ontem chorei. Toda aquela matemática me parece tão ridícula e eu imagino um mundo onde tudo seja mais homem, mais suave e me recordo que nem eu mesmo sou assim. Descobri o que sou e talvez não seja o que eu queria. Sou egoísta, hedonista, aprazível e amoral. Sou impetuoso e incorrigível e talvez o pior de mim seja não amar. Ainda. É um sonho estranho, mas ainda assim, sonho. Bem como o latim que flui de mim e toda aquela musicalidade órfã de quem um dia precisou de pai e não teve. Ou eu tive e não precisei. Faço questão de ser mãe da minha mãe, de cuidar para que ela não sucumba diante dessa vitta, que por sinal ela mesma buscou. Mas não faz mal, pelo menos ela sabe ao que busca. Pareço nojento e prepotente, ao ouvir baixinho o mundo lá fora a discutir qual é o mais forte de seus dois pólos. Nem café tem mais tanta graça; quero me casar, quero meus filhos - que saudade deles - quero fugir. Quero as pessoas somente nas imagens que tive delas espalhadas pela minha parede e hoje nem isso. Sou um ser desprezível por pedir, mas quero distância de tudo que não domino. No meu mundo tudo parece tão mais perfeito que só poderia ser de mentira. Ouço gritos agora, ouço choros. Prevejo traumas, sequelas, que nem isso pude ter. Minha vida foi tão mais forte, tão mais fácil de ser domada que tenho dó dos esvaídos de ímpetos como os meus. Pelo menos ainda me tenho, de pé. Na minha cabeça - raios. No meu corpo - alergias. Na minha alma - acasos. E nos acasos - tempo. Tempo para que tudo dê certo e eu sinto que um dia vai dar. Ainda que não para mim. 

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