Chuva de verão *

Uma das saudades que eu tenho de ser criança era poder ouvir meu coração batendo, me abraçar forte e sentir meu sangue pulsando, meus movimentos do lado de dentro. E quando crescida, já com os seios fartos, não posso mais ouvir o som do coração. Não posso deixar a dor desafrouxar de uma vez, talvez eu nem sinta tanta dor mais. Ou talvez eu tenha me acostumado, por fim. Porém hoje deitada, a fitar o quadro na parede, vi no cinza um desespero, no vermelho uma angústia e num lampejo ouvi um tum-tum abafado, sofrido, de quem chora no canto pra ninguém ver. Meu coração tentava sair de mim, se libertar das artérias rígidas que o prendem. Ele forçava a passagem e avançava. O coração é incompreendido - fala, grita, berra. Mas é preso no peito para não ser ouvido. E por mais que eu queira ouvi-lo, temo não falarmos a mesma língua...

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